quinta-feira, 8 de agosto de 2013

O Aroma das Especiarias - Joanne Harris, opinião

Demorei assim um bocado a escrever esta opinião, mas finalmente cá está :)



Título Original: Peaches for Monsieur Le Curé
Autora: Joanne Harris
Editora: Edições ASA
Número de páginas: 496

Sinopse:

Vianne Rocher recebe uma estranha carta. A mão do destino parece estar a empurrá-la de volta a Lansquenet-sur-Tannes, a aldeia de Chocolate, onde decidira nunca mais voltar. Passaram já 8 anos mas as memórias da sua mágica chocolataria La Céleste Praline são ainda intensas.

A viver tranquilamente em Paris com o seu grande amor, Roux, e as duas filhas, Vianne quebra a promessa que fizera a si própria e decide visitar a aldeia no Sul de França. À primeira vista, tudo parece igual. As ruas de calçada, as pequenas lojas e casinhas pitorescas… Mas Vianne pressente que algo se agita por detrás daquela aparente serenidade. O ar está impregnado dos aromas exóticos das especiarias e do chá de menta.

Mulheres vestidas de negro passam fugazes nas vielas. Os ventos do Ramadão trouxeram consigo uma comunidade muçulmana e, com ela, a tão temida mudança. Mas é com a chegada de uma misteriosa mulher, velada e acompanhada pela filha, que as tensões no seio da pequena comunidade aumentam. E Vianne percebe que a sua estadia não vai ser tão curta quanto pensava. A sua magia é mais necessária do que nunca!

Sobre a Autora:

Joanne Harris nasceu no Yorkshire, em 1964, de mãe francesa e pai inglês.
Com  Chocolate, Vinho Mágico, Cinco Quartos de Laranja, A Praia Roubada, Na Corda Bamba, Danças & Contradanças, Valete de Copas e Dama de Espadas e Xeque ao Rei (todos publicados pela ASA), conheceu um retumbante sucesso internacional, que a adaptação ao cinema de Chocolate (com Juliette Binoche e Johnny Depp) veio intensificar.
Com Fran Warde, é co-autora dos livros A Cozinha Francesa e do Mercado para a sua Mesa - Novas Receitas da Cozinha Francesa, também publicados plea ASA.
Para mais informações sobre a autora pode consultar o site 

Opinião:


Uma carta da amiga Armand chega à morada de Vianne, em Paris, o local, onde, quiçá, permaneceu durante mais tempo, e fá-la recuar no tempo. Apesar da hesitação inicial, Vianne quebra a sua promessa, e regressa com as filhas à aldeia no Sul de França.
Embora num primeiro olhar tudo pareça igual, o local que fora a sua casa durante aquele tempo está diferente e Vianne começa a perceber aquilo a que Armand se referia. - Sobre este assunto, não consigo deixar de sorrir. Pois, quando a carta chega a Vianne, Armand, apesar de já ter partido, consegue prever os ventos de mudança que se aproximam e pede ajuda a Vianne. (e não vou resistir e vou colocar aqui a passagem referente à carta, porque pessoalmente, gosto muito da sua personagem eheh)

Após a sua chegada, a magia de Vianne vai ao encontro da nova comunidade de Les Marauds, uma comunidade muçulmana que anda mais ou menos em pé de guerra com a comunidade de Lansquenet-sur-Tannes. E durante a sua estadia, Vianne apercebe-se que o aroma dos pêssegos é capaz de envolver o coração mais empedernido e exercer o seu próprio poder sobre os ventos de mudança.

Joanne Harris, encerra, com "O Aroma das Especiarias", a trilogia Chocolate. E, a meu ver, este livro criou um impacto positivo depois da minha leitura do segundo volume "Sapatos de Rebuçado".
Passado oito anos desde a sua partida, quando regressa, apesar da aparência normal à superfície, Vianne encontra uma Lansquenet-sur-Tannes mudada. E aos poucos, também eu me vou apercebendo de pequenos pormenores que se vão destacando ao longo da leitura. Sendo talvez o primeiro e mais notório seja o lugar onde era  La Céleste Praline, outrora uma sinergia das mais ricas cores e aromas, agora enegrecido e marcado pela mudança. (fica aqui uma ponta do véu a pedir para ser desviada eheh)

No decorrer da história, Vianne trava conhecimento com uma família muçulmana que, se a princípio se sente algum receio, a acolhe e às filhas, com afabilidade no seu seio familiar. E sendo esta uma cultura que (corrijam-me se estiver errada) se encontra algo fechada ao mundo, ou mal retratada, gostei muito do facto da autora ter colocado a cultura muçulmana no enredo. Os meus conhecimentos acerca desta cultura eram muito poucos (não que agora sejam muito, muito maiores) e confesso que me deliciei e vi a minha curiosidade satisfeita nalguns pontos.
Todavia, não é só nesse meio que a magia de Vianne toca. Gostei de reencontrar personagens antigas como Josephine Muscat, e ver o impacto, algo turbulento, na nossa protagonista. E foi com alegre surpresa que acompanhei a transformação de uma das personagens que mais controversia gerou desde o início da trilogia. Quem diria que monsieur le Curé seria capaz de tal coisa. Mas apesar de estranho, é verdade que a mudança pode ocorrer nos momentos e nas pessoas mais improváveis...

Em suma, esta história está polvilhada de pequenos grandes detalhes que me fizeram altear a sobrancelha por diversas vezes, assim como ler com um certo frenesim, na esperança de ver o que acontecia no instante seguinte. E à semelhança das suas demais obras publicadas, Joanne Harris tem o dom de cativar os leitores com a sua escrita fluída, envolvendo-nos com suas personagens de certo modo marcantes e singulares e histórias com uma ponta de magia. E esta não foi excepção.

Classificação: 4/5



Querida Vianne,

Lembro-me do primeiro telefone a ser instalado em Lasquenet. Ena! Que alvoroço que causou. Toda a gente queria experimentá-lo. O bispo que o tinha em sua casa, foi inundado com presentes e subornos. Bem, se as pessoas pensavam que era um milagre, imagina o que pensariam que isto é. Eu, a falar contigo do mundo dos mortos. E, para o caso de estares a perguntar-te, sim, há chocolate no Paraíso. Diz a monsieur le Curé que o disse eu. Vê se ele já aprendeu a aceitar uma piada.

Oito anos. Muito pode acontecer, heim? As meninas pequenas começam a fazer - se crescidas. As estações mudam. As pessoas partem. O meu neto, com vinte e um anos! Uma boa idade, lembro - me disso. E tu, Vianne – partiste? Penso que sim. Ainda não estavas pronta para ficar. O que não quer dizer que não o faças algum dia – tem - se um gato dentro de casa e ele só quer voltar a ir lá para fora. Deixa - se lá fora e mia para voltar a entrar. As pessoas não são muito diferentes. Descobrirás isso se alguma vez voltares. E porque é que eu voltaria?, ouço - te perguntar. Bem, eu não digo que seja capaz de prever o futuro. Não exactamente, de qualquer forma. Mas em tempos fizeste um favor a Lansquenet, embora nem toda a gente o visse dessa forma na altura. Mesmo assim, os tempos mudam. Todos o sabemos. E uma coisa é certa; mais cedo ou mais tarde, Lansquenet precisará de novo de ti.

Mas não posso contar com o nosso cure para te avisar quando isso acontecer. Por conseguinte, faz - me um último favor. Volta a Lansquenet de visita. Leva as crianças. E Roux, se ainda estiver aí. Põe flores na campa de uma velha senhora. Não da loja do Narcisse, mas flores a sério, dos campos. Diz olá ao meu neto. Toma uma chávena de chocolate.

Oh, e mais uma coisa, Vianne. Havia um pessegueiro ao lado da minha casa. Se vieres no verão, os frutos devem estar maduros e prontos a ser colhidos. Dá alguns aos pequenitos. Detestava que ficassem todos para os pássaros. E lembra - te; tudo regressa. O rio acaba por trazer tudo de volta.
Com todo o meu afecto, como sempre,

Armand 

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